Incorporada na coleção do Museu Nacional Soares dos Reis em 2001, após ter sido adquirida no ano anterior no leilão da Coleção Canto da Maya, a escultura Baiser (O Beijo) completa, em 2024, 90 anos sobre a sua criação.
O Beijo é uma obra modernista em barro patinado fazendo valer aspetos de uma arte figurativa que explora o ideal de retorno às raízes europeias, nas linhas propostas pelos escultores Antoine Bourdelle e Aristide Maillol, uma corrente que ganhou adesão em Paris pela década de 1920.
No conjunto da obra de Canto da Maya, o Beijo enquadra-se numa fase em que o autor exalta o que é exuberante e o sensitivo, na procura da essência do ser humano. As figuras saem totalmente fora dos cânones e são modeladas em barro, a matéria-prima ideal para dar forma à noção de erotismo.
Canto da Maya reduz os corpos ao fundamental modelando em barro as figuras unidas num abraço, sentadas no solo; o volume denso mostra superfícies lisas e linhas curvas. Esta técnica é sugestiva da sua visão da Escultura como uma Arte Primitiva.
“Ernesto do Canto Faria e Maia nasceu em Ponta Delgada [em 1890]. Com formação artística em Lisboa, Paris, Genebra e Madrid, e a carreira mais consagrada e internacional de um escultor português na primeira metade do século, Canto da Maya destaca-se entre os percursores do modernismo figurativo com uma original estética decorativista.
Entre Paris e Lisboa, cria esculturas – grandes conjuntos, figurinhas de terracota ou gesso, bustos, baixos-relevos, figuras metafóricas dos ciclos da vida ou da feminidade – cuja expressividade anatómica e idealidade poética foi muito premiada, e escolhida para representar a arte francesa (Tóquio e Osaka, 1926), e Portugal, em várias exposições universais (Paris, 1937; Nova Iorque, S.Francisco, 1939) e na Bienal de S. Paulo (1957).
Desempenhou também um papel central na exploração da art déco, colaborando em projetos com célebres arquitetos. Uma viragem a meio da carreira leva-o da pioneira reinvenção da escultura figurativa ao academismo nacionalista, em longa campanha oficial de esculturas monumentais destinadas a enaltecer a propaganda patriótica do Estado Novo, que lhe atribui o Grau de Oficial da Ordem Militar de Sant’Iago da Espada (1941).
Apesar de diferentes fases e faces, a obra de Canto da Maya continua a atrair sucessivas homenagens e retrospetivas desde a década de 30, em Portugal e França. Canto da Maya morreu em Ponta Delgada [em 1981]”[1].