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Categoria de Coleção: Têxtil

A coleção de Têxteis do Museu Nacional Soares dos Reis abrange essencialmente os séculos XVII, XVIII e XIX e pode ser agrupada em três núcleos: histórico, religioso e civil.

O núcleo histórico é constituído por peças com significado no contexto da História da cidade do Porto. O religioso é o mais numeroso, constituído por vestes usadas pelo celebrante na missa e peças com que se adornam as igrejas. O núcleo civil integra peças de vestuário feminino e masculino, bem como colchas e tapeçarias. 

A coleção foi formada inicialmente a partir do património confiscado a igrejas e conventos, no contexto da Guerra Civil e no decorrer do Cerco do Porto (1832-1833) quando D. Pedro IV decidiu a criação, nesta cidade, de um museu com a finalidade de guardar e mostrar esse património. 

Posteriormente, com a República e a nova nacionalização de bens da igreja, são incorporadas mais peças pertencentes à Mitra do Porto.

Mais tarde, a título de depósito, entrou um diversificado conjunto de têxteis do Museu Municipal do Porto, extinto em 1937.

Do também extinto Museu Industrial e Comercial do Porto, a coleção veio a receber – em 1940 – um numeroso conjunto de rendas de bilros, representando os principais centros produtores do país, e recolhidas por Joaquim de Vasconcelos no final do século XIX.

Nos últimos anos, cresceu através de algumas aquisições pelo Estado, mas sobretudo por doações de particulares e depósitos de entidades como a Fundação Calouste Gulbenkian ou o Museu do Banco Nacional Ultramarino.

Véu de Cálice

Véu de Cálice

Século XVII

Índia

Fio de seda natural verde, vermelho, amarelo, branco; lâmina prateada

Ficha de inventário

Peça destinada a cobrir o Cálice, sendo este, para os católicos, o reservatório do Sangue de Cristo, após a Consagração realizada durante a missa, a principal cerimónia religiosa católica.

É inteiramente executado em tear, utilizando fios de seda e lâmina de prata. Esta peça tem uma aparência frágil, que advém do facto de o fio ser muito fino, o que lhe confere leveza e alguma transparência.

Apresenta ao centro a Cruz de Cristo, símbolo associado ao período das grandes viagens marítimas e das consequentes relações comerciais, culturais, políticas e religiosas com povos de outros continentes, neste caso a Índia, ligada a Portugal após a primeira viagem de Vasco da Gama. Por isto, e apesar da sua evidente simplicidade, tem sido incluído em catálogos de exposições alusivas ao período das Descobertas e às mútuas influências artísticas entre Portugal e a Índia.

Tapete de Arraiolos

Tapete de Arraiolos

Século XVII 

Lã; linho

Ficha de inventário

Atribuído ao século XVII, este tapete é considerado dos mais antigos que se conservaram entre nós.

Tem a particularidade de apresentar o ponto de bordado executado em várias direções acompanhando o movimento do desenho, e os motivos decorativos contornados a ponto “pé-de-flor”.

A decoração é marcadamente diferente no campo e na barra. No campo, ressaltam os enrolamentos vegetalistas, na barra, vemos uma sequência de flores e pássaros, e, nos cantos, águias bicéfalas.

 

A técnica dos tapetes a que chamamos “de Arraiolos” consiste num bordado executado com lã de ovelha sobre uma tela de estopa (a parte mais grosseira do linho) ou de juta. O ponto é cruzado, sendo uma das laçadas mais comprida.

Durante muito tempo as lãs foram tingidas com corantes naturais: a cor vermelha era conseguida a partir de pau-brasil e de trovisco, o azul era obtido com índigo, o amarelo a partir do lírio-dos-tintureiros…

Porquê Arraiolos? A explicação é dada por alguns investigadores como decorrente da expulsão dos muçulmanos de Lisboa, em 1498, e a consequente fixação de uma comunidade naquela localidade alentejana. O Tapete de Arraiolos é resultado do cruzamento de técnicas e tradições culturais: o gosto decorativo oriental e a técnica do bordado ocidental.

Vestido

Ateliê de Aline Neuville, Lisboa

Século XIX (final) ou século XX (início)

Veludo; fios de seda; rendas; lantejoulas; tule; crepe de seda; cetim de seda

Ficha de inventário

Peça constituída por saia e corpete, em veludo preto, profusamente decorado com motivos florais, utilizando rendas, tules, lantejoulas e diversos pontos de bordado.

A saia tem franzidos que partem da cintura, nas costas, que se prolongam numa acentuada cauda. Os motivos decorativos recortados ficam evidenciados pela cor clara do cetim interior.

O corpete é em grande parte coberto por rendas. Fecha à frente, remata junto ao pescoço por pequeno folho em crepe, de cor pérola. As meias mangas podem ser convertidas em mangas compridas, associando dois elementos com a ajuda de colchetes escondidos pela renda.

O recurso a diferentes materiais e texturas permite gradações de cor e de brilho que lhe conferem sumptuosidade: é certamente um traje de cerimónia. E dada a época da sua criação, podemos imaginar que tenha sido usado pela sua proprietária Sofia Cândida Rooke em receções oficiais no então Paço Real do Porto, onde hoje se encontra o MNSR.

Tem assinatura do ateliê de Aline Neuville, do qual era cliente a rainha D. Maria Pia.

Bordado de encaixilhar, Sedução

Bordado de encaixilhar, Sedução

Rosina Adelaide Aguiar Martins

1869 

Fios de seda policromos, froco, cabelo, missangas coloridas, papel. Suporte de seda.

Ficha de inventário

Trata-se de um tipo de trabalho comum no século XIX, e revelador da habilidade manual e do modo de ocupar o tempo de muitas mulheres, numa época em que a educação feminina fomentava este tipo de dotes artísticos e manuais.

Designamo-los como bordados de encaixilhar, porque na sua maioria eram executados com essa finalidade: protegidos com vidro e caixilho.

Destinavam-se por vezes a ofertas, podendo servir uma mensagem, de amor, de amizade ou gratidão. Este bordado teve por base uma litografia com o título Verführung, palavra alemã que significa sedução. Repare-se nas mãos e rostos em que foram utilizados recortes da impressão em papel que a autora coloriu.

Reproduções como esta circulavam, por exemplo, através de revistas de modas e bordados e chegavam às mãos de quem as replicava com habilidade de agulha.

A obra regista, na zona inferior, bordado a fio de cabelo, a autoria e a data da execução.

Bolsa

Bolsa

Século XIX (início)

Sisal, de cor natural e policromo; bambu                               

Ficha de inventário

A necessidade de guardar e transportar consigo, levou desde muito cedo, homens e mulheres, a criar sacos e bolsas para os seus pertences, comida, armas, moeda.

Posteriormente, as algibeiras surgiram com o mesmo intuito, quer fazendo parte integrante do vestuário, quer como complemento destacável, pendurado na cintura.

Nos finais do século XVIII, o traje feminino fluido, sem cintura, próximo do corpo, impõe o saco de mão. Sendo este traje “império”, inspirado na moda do Império Romano, então visível nas pinturas a fresco das ruínas de Pompeia, posta a descoberto por aquele tempo, também as “reticulum”, bolsas de rede usadas pelas mulheres romanas, influenciaram muitos modelos.

A bolsa de senhora que aqui vos mostramos, apesar de já do início do século XIX, reflete esse gosto.

Executada em malha de agulhas, formando barras verticais, alternadamente lisas e rendadas, é bordada nas barras lisas com ramos de flores, aves e insetos. Tem base rígida, em segmentos de bambú colocados em ziguezague, sugerindo uma cesta. Termina na parte superior com folho em renda de bilros e aperta com cordões, rematados com duas borlas.

Véstia

Véstia

Século XVIII (meados)

Cetim de seda; fios de seda; metal
Ficha de inventário

Peça de indumentária masculina, a véstia era usada sobre a camisa e por baixo da casaca, sendo esta última sempre mais comprida e mais decorada. Fossem da mesma cor, ou de cores diferentes, a casaca e a véstia completavam-se.

Esta véstia apresenta-se cintada, fechada na frente por botões dourados com decoração relevada (dos quais, infelizmente, já restam poucos) colocados em duas fileiras paralelas, apenas com casas de um dos lados. Tem mangas compridas, bolsos com pala que esconde parcialmente 3 botões idênticos aos restantes. É bordada a fios de seda, nas cores creme e verde, cumprindo um desenho estilizado de inspiração vegetalista.

Repare-se que o bordado, talvez pelo brilho do suporte ou dos fios de seda, dá uma primeira ilusão de ser dourado. Porém, o fio metálico dourado não toma parte nesta decoração.

Este modelo, com as suas variantes, esteve em voga no séc. XVIII, quando a indumentária masculina era concebida, tal como a feminina – e sem ficar a dever nada a esta, quer em requinte, quer em luxo, ou mesmo em extravagância – para uma “festa” permanente, de acordo com a mentalidade da época, e seguindo a moda, ditada principalmente pela corte francesa de Versalhes.

Conjunto de saia e casaco

Século XVIII (meados)

Cetim de seda (exterior); algodão (interior)

Ficha de inventário

Conjunto de saia e casaco, provavelmente de inverno, em seda verde, inteiramente decorado com motivos geométricos e vegetalistas relevados, conseguidos por pesponto que une o tecido exterior ao tecido interior, passando pelo enchimento entre os dois, resultando num belo efeito acolchoado.

O casaco é cortado na cintura, de onde pende uma grande aba, que se sobrepõe à saia até abaixo da anca. Esta aba é mais comprida e mais rodada nas costas.

Fecha na frente por colchetes e remata na zona superior por encaixe de rendas brancas, das quais saem pequenos fitilhos de seda, verdes. Manga com dobra repuxada, a cobrir o cotovelo.

A saia, de corte direito, é franzida na cintura, para cobrir folgadamente a armação interior, que formava as “anquinhas”, próprias da moda do século XVIII.

Conhecem-se modelos com alguns elementos acolchoados, mas este exemplar torna-se raro por apresentar esse efeito na sua totalidade. Esta característica e os motivos decorativos remetem-nos para as colchas produzidas na Índia, que, durante os séculos XVI e seguintes, Portugal transacionou e exportou. Contudo, não podemos afirmar a sua origem indiana: exemplares semelhantes em museus estrangeiros são classificados como ingleses.

Farda de Coronel Honorário do Batalhão de Caçadores Nº 5

Elementos do uniforme usado por D. Pedro durante o Cerco do Porto (1832 – 1833), episódio mais marcante da guerra civil entre liberais (por D. Pedro) e absolutistas (por D. Miguel).

Em 1822 D. Pedro havia proclamado a independência do Brasil, tornando-se o 1º Imperador. Contudo, por morte de seu pai, foi aclamado rei de Portugal e, por ter optado pela coroa brasileira, abdica do trono português em sua filha Maria, criança ainda, nomeando regente o seu irmão Miguel.

Miguel fez-se aclamar rei de Portugal, o que levou D. Pedro a abdicar forçosamente do trono brasileiro e a vir defender os direitos da filha. Desencadeia-se assim a guerra civil.

Foi nesse período que D. Pedro decidiu a criação de um museu que guardasse o espólio confiscado em contexto de guerra. É este Museu de Pinturas e Estampas, mais tarde designado de Soares dos Reis, que recebe, após a morte do seu fundador, o chapéu armado, o óculo, o porta-mapas e o talabarte. Entretanto, e simbolicamente, a rainha D. Maria II já havia entregue à cidade, a espada, o dólman, o colete e o boné, incorporados posteriormente no Museu Municipal do Porto, peças em depósito no MNSR.

Casula

Itália (?) 

Século XVIII (1ª metade)

Lhama de seda branca e fio dourado; bordado: fio dourado, sedas polícromas e contas de coral.

Ficha de inventário

Esta é a veste usada pelo sacerdote na missa, principal celebração religiosa católica.

De qualidade artística e técnica excecionais, esta casula é executada em tecido de fio de seda e fio dourado – lhama – e apresenta decoração de inspiração vegetalista, bordada a missangas de coral, sedas policromas e fio dourado, com acentuada influência oriental.

Pertenceu ao Paço Episcopal do Porto (Mitra).

Pensa-se que as casulas têm origem no vestuário civil romano, possivelmente na paenula, abrigo de recorte circular sem mangas, que cobria todo o corpo, tendo apenas uma abertura para a cabeça. De então para cá, foram sofrendo alterações de acordo com o gosto de cada época e as necessidades do culto.

Godrim/Colcha

Godrim/Colcha

Índia, possivelmente Cambaia, Guzerate

Século XVII 

Algodão; fios policromos de seda frouxa; enchimento de filaça de algodão.  

Ficha de inventário

Godrim é um termo apropriado do original indiano que designa uma colcha de abafo. Esta peça é constituída por duas telas de algodão, unidas pelos pontos do bordado, com um enchimento de filaça que lhe confere relevo e conforto. O bordado é executado predominantemente em ponto atrás, com motivos decorativos de carácter vegetalista, aves exóticas, desenhos cruciformes, cavaleiros trajados à portuguesa e, no medalhão central, um pelicano.

Os têxteis da Índia, e particularmente estes godrins, exerceram enorme fascínio quando Vasco da Gama os apresentou na corte, no regresso da sua primeira viagem. Esse agrado converteu-se rapidamente em encomendas por parte das classes mais abastadas, transformando-os em objetos de luxo e ostentação.

A procura ficou a dever-se à sua qualidade estética e ao bem conseguido cruzamento entre oriente e ocidente: do oriente, a matéria-prima, a técnica, os elementos simbólicos e decorativos; do ocidente, os valores simbólicos portugueses (heráldicos e outros). Respondiam também a vários requisitos: cobrir camas, dosséis, decorar paredes de habitações ou de igrejas, enfeitar varandas ou dar conforto a estrados em dias solenes.

Estas peças eram produzidas predominantemente em Cambaia, na região de Guzerate, e eram transportados anualmente em grande número pelas naus da Carreira da Índia através de Goa, no então Estado Português da Índia.